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Pouco tempo atrás, li este lindo texto da Tatá, texto que adoraria ter escrito. Cada frase contém um pouco de mim, foi identificação instantânea. Não como aquelas sopas ralas, macarrões moles. Muito mais denso, com toda sustância necessária para viver cada um daqueles sentimentos.

"porque eu quero ser tudo o que eu puder. chega de barreiras, de limites, de cercas me delimitando espaço e me dizendo por onde eu posso ou não posso ir. meu caminho é o mundo inteiro. todas as cores, todas as dores, todos os 'sims' e todos os 'nãos'. eu quero tudo, o amor e a dor, quero da cabeça aos pés, quero por fora, por dentro e o que mais tiver direito. vontade do mundo. vontade de vida, vontade de me deixar colorir por dentro.
às vezes é assim mesmo. vem um tufão impiedoso, derruba tudo pelo caminho e deixa a gente de peito aberto, indefeso diante da vida.
dá medo. ah, dá. um medo danado.
porque é intenso, e derruba, e transforma. e às vezes dói. e às vezes muito.
mas quando a gente se levanta no dia seguinte, olha pela janela e um sol desavergonhado vem nos dar bom dia convidando a começar tudo de novo, ai, que vontade que dá.
eu tô assim.
pura vontade. pura intensidade.
os braços abertos antes do salto de pára-quedas. o imenso vazio azul-celeste até onde a vista enxerga. o coração batendo acelerado.
e aquele friozinho inconfundível na barriga."


Porque a enorme vontade de ser, fazer e viver é grande. Vai além do óbvio a mistura diversos e intensos sentimentos, então, não raras vezes saio correndo. Do outro lado da linha, aquela voz tão firme, sempre sabe o que diz: "permita-se", dizia ela. Saia do chão, sonhe, porque você pode. Você é linda por dentro e por fora. Pare com essa auto-sabotagem.
Tudo bem, pode entrar, porque quero torbellino e muito mais.

imagem: Thais Beltrame


A vida é realmente muito maluca. Quando era criança pensava que conforme as pessoas cresciam os caminhos já eram definidos, que todos cresciam, estudavam, se formavam, namoravam, casavam, tinham filhos, pagavam contas, envelheciam, tinham netos, e morriam. Mais ou menos assim. Nunca percebi a complexidade da vida, de ser adulto, do dia a dia, das mudanças de caminhos, da quantidade de amores que podemos ter, de quantos sentimentos diferentes existem, de quantas infinitas possibilidades temos, simplesmente pelo fato de estarmos vivos.
Se eu tivesse prestado um pouco mais de atenção teria visto que os meus pais, ali, bem aos meus olhos eram exemplo clássico dessas diversas possibilidades.
Confesso que cresci não os entendendo, e por serem tão diferentes, desenvolvi uma mania de criticá-los. Mal sabia eu, que sou tão parecida com eles. Então a menina cresceu, a princípio somente em tamanho. Queria ser diferente daqueles dois tão fora do padrão. Ser fora do padrão era tudo que eu não gostaria de ser. Mas eu já era, e não percebi. A mesma vontade de viver que meus pais tinham, era enraizada em mim. Hoje, entendo perfeitamente aqueles dois, que eu chamada de loucos. Eram loucos pela vida. Que lindos. Ainda bem que sou filha deles, não poderia ser filha de uma Maria e João, Paulo e Regina, Carlos e Lucia. Sou filha deles, sou como eles. Trago dentro de mim essa vontade de sentir as coisas, de amar as pessoas, de superar as dores, de crescer, de ser digna em todos os meus momentos. Com eles, aprendi a não ter preconceito, sou muito grata por isso.

É muito bom, poder ver beleza onde a maioria das pessoas vê feiúra. Um exemlo clássico desta minha curiosidade pela vida, me leva ao Sr. Raimundo. Raimundo, seu nome de batismo. Fala o português perfeito, sem erros, pronúncia clara. Temos algo em comum que é a escrita. Assim como eu, ele gosta muito de escrever, e o faz com magnitude. Vejo Sr. Raimundo diariamente a caminho do trabalho. Há anos passo em frente a sua morada, sempre com muita vontade de parar para conhecê-lo pessoalmente. Tenho a idéia clara de que posso aprender algo com as histórias de vida alheias onde sei que posso encontrar a beleza que não é vista a olhos nus.
Sempre atrasada para o trabalho não conseguia parar para bater um papo com o Sr. Raimundo.
Mas aquele desejo crescia, e certo dia acordei bem mais cedo, passei na padaria, comprei um pedaço de torta de frango para levar, afinal, não se chega na casa de alguém pela primeira vez com as mãos abanando.
Não consegui estacionar o carro, então parei e o chamei. Nos conhecemos rapidamente, entreguei a torta, falamos sobre a pressa na vida cotidiana. Ele me pediu que voltasse pois escreveria algo pra mim, e assim combinamos, no sábado. Esperei ansiosa pelo sábado, e chegado o dia fui visitá-lo com calma.
Quando cheguei, ele estava fazendo a janta, e escrevendo.
- "O que está escrevendo?"
- "Meu diário de nutrição. Anoto tudo o que consumo, para saber se estou me alimentando corretamente"
Nossa, nunca fiz isso!
- "O que mais o senhor escreve?"
-"Pensamentos, sentimentos"
- "Também gosto muito de escrever"
-"Faz bem à alma".
- "E o frio, como o senhor está passando?"
-"Não gosto do frio, mas a gente aprende a conviver com o que é difícil"
Queria levar um cobertor a ele, mas ele recusou. Estava acostumado a viver assim. Mais tarde, ofereci 2 reais, e ele recusou, decididamente.

Ele estava sentado, com seu caderno no colo, então, me agachei, e fiquei ali, conversando não sei por quanto tempo, não poderia olhá-lo de cima para baixo, me sentia pequena demais perto de Raimundo. Ele têm olhos doces. Tem um coraçnao bonito, por trás daquela roupa preta.
Não bebe, não fuma. Pedia licença de vez em quando para dar uma olhada na panela que estava no fogo.
Me entregou o escrito, como havia prometido:

-"Gestos - Páginas Autografas.

"Na escola, o único aluno com sinal de desnutrição, hoje, acabaria, fonte de nutrição mental".

aas.: o "Condicionado".
SP, 16-6-1999+10(<) "
.

Ainda não sei como ele foi parar ali, achei invasão demais perguntar isso no segundo encontro.
Raimundo é nobre.
Na despedida, ele convida-me a jantar:
-"Gostaria de ficar para jantar?".
Não aceitei pois tinha comido há menos de 2 horas.
Combinamos que eu voltaria para batermos mais papo.
-"Foi um imenso prazer conhecê-lo", eu disse. E nos despedimos.

Ela tem cara de fada. Olhos grandes e bem azuis, sorriso largo e bonito. Jeito, nem tanto. Solta palavrões, é debochada, engraçada.
Nossas vidas se cruzaram meio que por acaso, éramos namoradas dos amigos. Não havia nenhuma lei, nada que fizesse obrigação nos tornarmos amigas. Mas a amizade nasceu, floresceu, se fortificou. Sua presença sempre ilumina o ambiente. Notável, inteligente. Com o pasar dos anos, minha admiração crescia, seus conselhos, as vezes em forma de bronca eram sempre bem vindos. Sensata. Ai, que linda sinceridade. Em algum momento, ficou estabelecido que seríamos madrinhas. Fui sua madrinha de casamento, que imenso prazer! Éramos poucos naquele dia, mas me sentia honrada por fazer parte de um momento tão importante. Como o meu amor por aquelas duas pessoas poderia ser tão grande? Eles eram exemplo de amor, não um amor perfeito, de novela. Mas um amor de verdade, com dificuldades, brigas, cotidiano. Mas eles são tão lindos, perfeitos um para o outro. Necessários como amigos.

Entretanto, como tudo na vida, as coisas mudam de rumo. Eles, sempre ao meu lado, era como se na separação de bens, tivesse sido decretado "eles ficam com você". Ainda acho que saí ganhando.
Quando feita a descoberta da existência do meu maior amor, dúvidas. Medo. E agora? "Estou aqui, amiga.". Suas palavras me deram uma imensa coragem, certeza de que eu poderia enfrentar o mundo, com ela ao meu lado. Também, por essa conversa, houve um fim de amizade. Cada um, segue por onde quer.
Durante toda sua estadia aqui, ela estava ao meu lado.
Mas, quando ela se foi, aquela força não pôde estar ao meu lado. De alguma forma, eu sempre senti que essa força continuava comigo.
Do meu crescimento, inclusive, fez parte esse grande teste. Mas meu amor por ela era maior, e eu sabia que se aqueles olhos azuis não estavam comigo, não era por falta de vontade. A dona deles também é humana, tem fases como eu, como qualquer um. O que importa, é que estávamos sempre em seu coração. Hoje, ela está ao meu lado, e a boneca tem um coração só seu. Do lado direito, como deveria ser. E é assim que são ser os amigos de verdade. A madrinha no meu, eu e a Lelê no dela.
Te amo muito, madrinha.

Gosto muito de ver o tempo passar, cada novo dia, um acontecimento, uma surpresa, um novo amigo, um novo aprendizado, uma descoberta. Não necessariamente cada caoisa citada seja boa, mas é o movimento. Aprendi a gostar demais de ver tudo em movimento.
Confesso que realmente não sei para onde estou indo, mas o bom é que vou. Em alguns passos encontro alguém que queira me acompanhar, uma mão amiga, um abraço, ou simplesmente alguém que caminha comigo, simplesmente por querer estar aquele instante ali.
A boneca, sempre aqui, dentro de mim, fazendo com que meu amor continue crescendo, crescendo.
Dia desses, descobri algo interessante sobre mim. Porque eu não comparo outras crianças, ou situações com a nossa história, o porque não olho para uma criança e penso "ela estaria assim, ou estaríamos vivendo do jeito assado", raras exceções como datas especiais. Simplesmente porque não nos foi permitido outra escolha. É desse jeito, e pronto. Nada mudaria o desfecho disso, então, basta o amor que existe.
O resto, são histórias, que não nossas.
Ouço muito as pessoas dizerem com certa admiração, que não entendem como consigo. Também não sei como, simplesmente, é assim. Não tão difícil, mas não tão fácil. Algo que só eu entendo, e ninguém mais.

e assim continuo, um dia de cada vez, olhando sempre em frente, com a certeza que todos os dias são diferentes.

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